A cobertura da morte de figuras públicas na imprensa portuguesa
Palavras-chave:
morte, notoriedade, espetacularização, tabloidização, pós-verdadeResumo
A morte assume relevância do ponto de vista das narrativas mediáticas e, quando conjugada com a proeminência das personalidades envolvidas no acontecimento, confere maior peso à decisão do que pode ou não ser notícia. Neste trabalho propusemo-nos analisar a cobertura da morte de 20 personalidades públicas em três jornais diários portugueses: Correio da Manhã, Diário de Notícias e Jornal de Notícias. Escrutinámos o tratamento mediático que foi feito da morte de António de Oliveira Salazar, Fernando Pascoal das Neves, Francisco Sá Carneiro, Joaquim Agostinho, António Variações, José Afonso, Carlos Paião, Miguel Torga, Beatriz Costa, António de Spínola, Vítor Baptista, Amália Rodrigues, Sophia de Mello Breyner, Álvaro Cunhal, José Megre, Raul Solnado, José Saramago, António Feio, Angélico Vieira e Eusébio da Silva Ferreira. Encontrámos tratamentos similares em alguns casos e coberturas diferenciadas em outros. Compreendemos que a morte enquanto disrupção e alteração no curso da vida é tanto mais mediatizada quanto maior foi o estatuto da personalidade que faleceu. Este estudo aponta não só no sentido da evolução das formas de tratamento dessa disrupção, como também invoca alguns mecanismos identificados nos jornais, concomitantes com a hiperconcorrência, a tendência para a espetacularização, a acentuação da tabloidização e com o fenómeno da pós-verdade.
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