Chamada de Artigos - Eikon #14

2023-09-06

EIKON abre chamada para dossiê:

                                                             A semiótica na comunicação da ciência

Em que medida  a semiótica pode contribuir para os estudos da comunicação pública da ciência? Com essa questão, abrimos a chamada do dossiê “A semiótica na comunicação da ciência”, da revista Eikon, editada pelo LabCom da Universidade Beira Interior (UBI). 

As editoras convidadas são as pesquisadoras brasileiras Claudia Quadros, Kati Caetano e Tattiana Teixeira. A primeira é professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e realiza o seu pós-doutorado em Comunicação Pública da Ciência na UBI , com ênfase nas plataformas de redes sociais digitais.  Kati Caetano, professora da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), aciona a semiótica para os seus estudos na comunicação, com destaque para a imagem nos mais variados dispositivos. Tattiana Teixeira, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pesquisa narrativas jornalísticas, tendo como foco a infografia. Ela inclui nesses estudos a divulgação da ciência e o jornalismo científico.    

A proposta para esse dossiê é reunir trabalhos que acionem a semiótica para pensar a comunicação da ciência nos mais variados meios de comunicação e/ou instituições. 

A semiótica tem como objeto o estudo dos processos de significação, compreendidos em sua dimensão sensível e inteligível. Tem como foco distintas formas discursivas, abordadas, sobretudo, em suas interfaces e nos processos interacionais. Dentre tais objetos, encontram-se os diversos  modelos e produtos  de comunicação pública da ciência e da tecnologia (CPCT), assim como os procedimentos de mediação entre a esfera delimitada do discurso científico e a divulgação dos resultados das pesquisas científicas para múltiplos públicos. (BUCCHI & TRENCH,2021).

Do ponto de vista da semiótica do discurso, a comunicação da ciência consiste em procedimentos transformativos em vários níveis da geração do conteúdo, buscando tornar o pensamento complexo mais acessível, ou apreensível, por meio de recursos que envolvem estratégias enunciativas de recontextualização, redefinição, exemplificação, ilustração, argumento de autoridade. Há que se considerar ainda que tais processos podem ser transformados em discursos verbais, ou sincréticos, agenciando imagens, fixas ou em movimento, áudio, audiovisuais, visualização de dados, infografias, para concretizar melhor o pensamento. Nessas formas de tradução intersemiótica, podem se recorrer a medialidades específicas ou intermedialidades, agenciar informação destinada a diferentes públicos, incluindo aquele formado por  não especialistas, podendo, assim, promover maior participação cidadã em tomadas de decisões estratégicas nas áreas de Ciência, Tecnologia e Inovação. Nesse caso, há também constituintes relevantes para atrair a percepção atencional, como o ritmo, o tom de voz, a alteração tônica, a dimensão do discurso.

Todos esses fatores, além de outros, como as injunções histórico-culturais sobre a concepção de ciência, o imaginário das práticas científicas, os períodos de pandemia, como a da Covid 19, a criação de veículos ou editorias específicas para certo tipo de público e a própria imbricação de informações nas redes sociais, com a descentralização do papel exclusivo de jornalistas ou especialistas na divulgação da ciência, contribuem para manter o interesse sobre um tipo de comunicação cada vez mais expandido na era da conexão e atualização em tempo integral.

Uma abordagem possível é também aquela de uma arqueologia de posturas paradigmáticas na compreensão do enlace homem - mundo para o pensamento que se propõe a ser científico. Em seu clássico texto “L’énonciation (une posture épistémologique)”, Greimas (1974) afirma a propósito da perspectiva de Husserl em busca de um modo de objetivação do conhecimento: “Qual era a preocupação fundamental de Husserl? Para ele, o problema consistia em saber como colocar entre parênteses o sujeito da enunciação, que seria, de seu ponto de vista, a condição da possibilidade da ciência. Como filósofo de inspiração Kantiana, evidentemente o sujeito psicológico não tinha consequência, mas sim o sujeito transcendental, o sujeito coletivo. Está nisso a verdadeira problemática, isto é, se nosso conhecimento do mundo resulta sempre de um sujeito cognoscente, o que podemos dizer de seguro e certo sobre o mundo, em que condições a ciência é então  possível? Seria a ciência do sujeito apenas e não da ciência do objeto. Eis aí, no início do século XX, à altura dos anos trinta, como o problema se colocava. O que se chama a redução fenomenológica, é a operação que nos permitiu respirar, colocar a possibilidade de inscrever o mundo como objeto, o mundo dos fenômenos desconhecidos. A teoria dos esquemas de relações instala-se sobre as implicações filosóficas desse gênero”. Derivam daí questões atuais como: de que maneira o conhecimento científico é relatado visando a processos de veridicção, de um fazer crer ser verdadeiro? Em que medida o sujeito enunciativo se expõe ou tenta se anular nas condições da produção do que seria a “verdade” dentro de determinado quadro epistêmico?

Não ficam de fora as investidas contra o discurso científico, pelo menos aquele que se projeta midiaticamente como hegemônico. Ainda que empregando recursos similares aos de vulgarização da ciência, tais discursos encontram na componente passional um forte argumento de persuasão e contágio. De que modo abordá-los situacionalmente e em contraste com formas discursivas institucionalizadas pela academia?

Por fim, mas não menos importante, que abordagens semióticas - francesa, norte-americana, alemã, russa -, podem ser mobilizadas para a articulação da semiótica com a comunicação, e de ambas para compreender a inteligibilidade do mundo?

Em suma, o escopo do presente dossiê é apresentar estudos e análises que atualizem tais discussões, considerando a expansão do campo informativo com as potencialidades digitais, apontando tanto para perspectivas futuras quanto para a dimensão histórica da comunicação pública da ciência em nossa sociedade.

 

Referências

GREIMAS, A. J. (1974). L’ Énonciation(une posture épistémologique). Significação: Revista De Cultura Audiovisual, (1), 9-25. https://doi.org/10.11606/issn.2316-7114.sig.1974.90115.

BUCCHI, M. TRENCH, B. (2021). Routledge Handbook of Public Communication of Science and Technology: Vol. Third edition. Routledge.